Hilma af Klint nasceu em 26 de outubro de 1862, em Solna, Suécia. Desde jovem, demonstrou aptidão para o desenho e a pintura. Em 1882, aos 20 anos, foi aceita na Real Academia Sueca de Belas Artes, uma conquista rara para mulheres da época. Sua formação acadêmica se deu dentro dos moldes tradicionais, com foco em retratos e paisagens. No entanto, sua verdadeira revolução artística começaria apenas décadas depois, com o desenvolvimento de uma linguagem abstrata pioneira e espiritualmente orientada.
A infância e juventude: cores vibrantes, formas em expansão (1907)
The Ten Largest No. 1 - Childhood (1907)
Essas duas obras inauguram a série "The Ten Largest", criadas em 1907. A paleta de cores vivas e os elementos circulares e florais remetem à fase inicial da vida - a infância. O azul predominante em No. 1 pode ser interpretado como símbolo de introspecção, enquanto o rosa e laranja de No. 2 revelam uma vitalidade latente.
Juventude: crescimento e conflito (1907)
The Ten Largest No. 3 - Youth (1907)
Durante sua juventude, Hilma passou a se envolver com práticas espiritualistas e ciências ocultas. Os quadros dessa etapa mostram formas concêntricas em expansão, refletindo um momento de crescimento interior e busca por respostas. O uso de cores contrastantes transmite a dualidade emocional típica dessa fase da vida.
A idade adulta: estrutura, ciência e espiritualidade (1907-1908)
The Ten Largest No. 5 - Adulthood (1907)
Essas obras mostram um amadurecimento evidente na linguagem visual de af Klint. Elementos gráficos mais organizados surgem, combinados com paletas em tons de amarelo e laranja. Os quadros mostram uma artista em plena fase de produção e consolidação de seu pensamento espiritual e simbólico, e refletem também sua crescente reclusão social e foco no trabalho.
Velhice: síntese e transcendência (1908)
The Ten Largest No. 9 - Old Age (1908)
Fechando a série "The Ten Largest", os quadros da velhice são mais suaves em tom e mais condensados em forma. O rosa pálido e o azul-claro remetem a uma fase de contemplação e aceitação. Esse período coincide com o aprofundamento de Hilma em estudos esotéricos e científicos - da teosofia à biologia.
Outras obras e temas centrais
The Current Standpoint of the Mahatmas (c. 1920)
Composta por formas gráficas e elementos circulares, essa obra sintetiza o interesse de Hilma por forças invisíveis e a busca por um ponto de equilíbrio entre o mundo físico e o espiritual.
Tree of Knowledge No. 5 (c. 1915–1920)
Com linhas mais orgânicas e formas botânicas, essa obra remete ao conhecimento como um organismo vivo - um tema constante em sua reflexão filosófica.
The Swan No. 1 (1915)
A série dos cisnes é um estudo sobre dualidade e união dos opostos. Aqui, af Klint trabalha com fundo preto e branco, cores vibrantes e formas simétricas para simbolizar polaridades espirituais.
The Dove No. 1 (1915)
Essa obra sugere paz e revelação, com uma paleta suave e arranjos simétricos. A pomba se torna símbolo de transcendência espiritual.
Primordial Chaos (1906)
Uma das obras mais precoces da sua fase abstrata, esta peça mostra a origem de tudo - uma energia primitiva em movimento espiralado, que antecipa os temas centrais de suas séries seguintes.
The Seven-Pointed Star No. 1 (c. 1908–1910)
Representa o misticismo numérico e simbólico de af Klint. A estrela de sete pontas une geometrias espirituais e cores complementares em equilíbrio dinâmico.
Svanen (c. 1915)
Esta obra isolada retoma o símbolo do cisne em composição distinta, com forte uso do vermelho e azul em fundo circular. A representação do ciclo da vida e da transformação espiritual permanece o foco central.
Expansão de legado e reconhecimento póstumo
Hilma af Klint morreu em 21 de outubro de 1944, aos 81 anos, após ser atropelada por um bonde em Djursholm, Suécia. Sua morte encerrou uma vida dedicada a uma produção artística que, por escolha própria, permaneceu em segredo por décadas. Ela acreditava que seu trabalho só seria compreendido muito tempo depois, o que a levou a manter grande parte de sua obra inédita em vida. Deixou mais de 1200 obras e 26 mil páginas de anotações, além de instruções claras para que suas obras não fossem exibidas ao público antes de 20 anos após sua morte.
Seu reconhecimento começou apenas nos anos 1980, quando estudiosos e curadores começaram a explorar os arquivos e acervos que ela havia deixado organizados. Ao longo das décadas seguintes, sua obra foi lentamente ganhando visibilidade internacional, até que em 2018, com uma exposição histórica no Guggenheim, em Nova York, sua importância foi finalmente consolidada diante do grande público. A mostra bateu recordes de visitação e atraiu um novo olhar para a história da arte moderna, reposicionando Hilma como uma figura central do movimento abstrato — não como uma exceção curiosa, mas como protagonista fundadora. Hoje, af Klint é reconhecida como uma das precursoras da arte abstrata moderna, com contribuições tanto visuais quanto filosóficas. Sua obra se tornou objeto de estudo em universidades, museus e centros de arte ao redor do mundo. Ela não apenas antecipou tendências estéticas, como também abriu caminhos para pensar a arte como experiência espiritual, simbólica e científica.
Nos últimos anos, instituições como o Moderna Museet, na Suécia, e a Tate Modern, em Londres, passaram a destacar af Klint em mostras permanentes e publicações críticas. Estudiosos têm aprofundado a análise de suas anotações manuscritas, revelando sistemas de organização visual e conceitual altamente sofisticados.
Sua inclusão tardia no cânone da arte moderna tem servido também para revisões mais amplas sobre o papel das mulheres nas vanguardas do século XX. A própria artista, consciente de sua posição marginalizada, optou por proteger sua produção do julgamento precoce, confiando que o futuro entenderia melhor suas propostas. Esse gesto hoje é visto como uma das maiores declarações de autonomia da história da arte contemporânea.
Além disso, exposições recentes e documentários como “Hilma”, lançado em 2023, contribuíram para renovar o interesse global em sua vida e obra. Livros, podcasts e pesquisas acadêmicas continuam a ampliar o alcance de seu legado, estabelecendo Hilma af Klint não apenas como uma pioneira, mas como uma referência central em debates sobre misticismo, abstração e estética expandida.